Introdução
A principal manifestação das labirintopatias é a tontura, que pode ser definida como uma impressão errônea de movimento. As tonturas são sintomas muito frequentes na população. Dados do National Institute of Health (EUA) consideram que 42% da população têm ou já tiveram tontura.
Esta prevalência aumenta nos idosos. Até os 65 anos de idade a tontura é considerada o segundo sintoma de maior prevalência mundial. Após esta idade seria o sintoma mais comum. Em indivíduos com idade superior a 75 anos a prevalência seria da ordem de 80%.
Em cerca de 85% dos pacientes com tonturas a causa reside no sistema vestibular, mas devemos lembrar que o equilíbrio corporal está baseado na interação de três mecanismos: vestibular, proprioceptivo e visual; os quais são integrados pelo sistema nervoso central.
Dessa forma, cumpre realizar inicialmente o diagnóstico topográfico, afastando causas centrais e extravestibulares de forma geral.
DIAGNÓSTICO
1. Anamnese
A história clínica é a parte principal da avaliação do paciente com labirintopatia. Alguns pontos que devem estar presentes na anamnese são:
a. Caracterização da tontura
· Tipo: a tontura rotatória recebe o nome de vertigem. Assim, vertigem é apenas um dos tipos de tontura que o indivíduo pode apresentar. A vertigem é mais característica de quadros periféricos. A tontura do tipo central pode mimetizar qualquer tipo de labirintopatia, mas sua característica mais frequente é a tontura do tipo instabilidade, não rotatória.
· Duração: a tontura pode durar de segundos a dias. É importante definir a duração do quadro agudo, já que a instabilidade pode se seguir a este quadro inicial e durar períodos longos e variados. O conhecimento da duração da tontura pode facilitar o diagnóstico, já que as tonturas que duram segundos são mais características de tonturas do tipo vertigem posicional paroxística benigna (VPPB). Na doença de Ménière a tontura dura minutos, normalmente mais de 20 minutos, e a duração de horas é mais característica de quadros de neurite.
· Frequência: existem quadros de labirintopatias que podem manifestar-se diariamente e, inclusive, várias vezes ao dia, como é caso da VPPB; por outro lado, há doenças que ocorrem em crises, podendo ficar longos períodos assintomáticos intercrise, como a migrânea vestibular e a própria doença de Ménière.
· Fatores desencadeantes: a história deve incluir a pesquisa de fatores desencadeantes da tontura. Na VPPB a tontura é desencadeada por movimentos da cabeça. Também na tontura de causa cervical, o movimento encefálico levando a torção cervical pode desencadear o sintoma. Nos casos de fístula, podemos encontrar na história a queixa de tontura desencadeada por ruídos intensos ou manobra de Valsalva.
b. Sintomas associados
Os quadros de tontura são comumente acompanhados de sintomas neurovegetativos, como náusea, vômito, sudorese. A cefaleia, quando presente, deve ser caracterizada, pois podemos estar diante de um quadro de migrânea vestibular, no qual a cefaleia tem características de quadros enxaquecosos. Cumpre lembrar que estes sintomas neurovegetativos podem ocorrer também em quadros de infarto agudo do miocárdio (IAM) e até de acidentes vasculares cerebrais (AVC). Por isso é importante que os sintomas sejam avaliados no sentido de um diagnóstico diferencial rápido e efetivo.
· Sintomas otológicos: a queixa de perda auditiva e zumbido associados ao quadro de tontura é comum. Estes são alguns sintomas que sugerem que o comprometimento seja periférico - associação de comprometimento coclear e vestibular.
· Perda da consciência: a queixa de "desmaio" é comum nos pacientes com labirintopatia que passam por uma crise intensa vertiginosa. Entretanto, o quadro labiríntico periférico NÃO leva a perda de consciência. O relato dos indivíduos são normalmente decorrentes da grande dificuldade de fixação ocular causada pelo nistagmo e pela consequente queda, que é bastante frequente. Cumpre, portanto, verificar se houve perda da consciência e, se realmente for caracterizada, afastar causas extralabirínticas para a crise - vasculares, neurológicas, cardiogênicas.
c. Antecedentes
Os antecedentes pessoais e familiares auxiliam na pesquisa etiológica da labirintopatia e na exclusão de causas extravestibulares da tontura.
2. Exame físico
Geral
O exame físico deve sempre iniciar com exame físico geral. Como já foi citado, o quadro agudo da labirintopatia pode simular quadros de IAM ou até de AVC.
O paciente em crise não raramente merecerá a realização de um eletrocardiograma e da avaliação neurológica. A medida da pressão arterial e da glicemia fazem parte desta avaliação inicial.
Específico
a. Otoscopia
A otoscopia deve ser realizada em todos os pacientes com tontura. Sua principal importância seria nos quadros agudos, nos quais pode ser diagnosticada uma otite média aguda (OMA), levando ao quadro de labirintite propriamente dita.
Além disso, a presença de rolha de cerume ou de otite secretora pode levar a quadros de instabilidade. A queixa de perda auditiva diante de uma otoscopia normal levanta a hipótese de uma surdez súbita, que pode ser coclear ou neural, sugerindo que exista um acometimento de orelha interna.
b. Testes vestibulares
Essenciais na avaliação do paciente com labirintopatias, os testes vestibulares se dividem em testes estáticos e dinâmicos.
US = ultrassonografia; RM = ressonância magnética.
Dentre os testes estáticos se destacam:
· Teste de Romberg - paciente colocado em pé, com braços ao longo do corpo, pés unidos e olhos fechados;
· Teste de Romberg-Barré - também chamado de Romberg sensibilizado, diferencia-se pela posição dos pés, que ficam um na frente do outro, diminuindo a base de sustentação.
Os exames são considerados alterados se houver queda. Nas labirintopatias periféricas é esperado que as quedas ocorram sempre para o mesmo lado, enquanto no quadro central elas são aleatórias.
Testes dinâmicos
· Teste da marcha - paciente marcha em linha reta de olhos abertos e fechados. Nos acometimentos vestibulares unilaterais o indivíduo desvia a marcha para o lado com menor função. Nesta prova também podem ser diagnosticados quadros de ataxia que sugiram acometimento cerebelar.
· Teste de Unterberger-Fukuda - paciente marcha parado no mesmo lugar de olhos fechados. Observa-se a rotação para o lado hipoativo se houver lesão vestibular unilateral.
c. Testes cerebelares
Os testes cerebelares fazem parte da avaliação do paciente com labirintopatia, pois, sendo o cerebelo um regulador de diversas funções, dentre elas o equilíbrio corporal, um acometimento cerebelar pode mimetizar uma alteração vestibular. O paciente com lesão cerebelar não consegue realizar os testes citados abaixo unilateral ou bilateralmente:
· Índex-índex: paciente, de braços estendidos e olhos fechados, deve fechar os braços encostando as pontas dos dedos entre si e abrir novamente os braços, repetidamente;
· Índex-nariz: paciente, de braços estendidos e olhos fechados, deve fechar os braços alternadamente, encostando as pontas dos dedos na ponta do nariz;
· Diadococinesia: paciente realiza movimentos repetitivos, como bater as mãos nos joelhos, com a palma para cima e para baixo, alternadamente, de forma a avaliar a coordenação.
d. Pares cranianos e força muscular
Assim como os testes cerebelares, a realização dos testes dos pares cranianos e a medida da força muscular em membros superiores e inferiores têm o objetivo de verificar a existência de etiologias extravestibulares.
e. Nistagmo
Conseguir identificar e caracterizar o nistagmo nem sempre é simples, mas pode definir topograficamente a lesão e, muitas vezes, determinar o prognóstico e o tratamento da doença.
Os nistagmos são:
· Espontâneos - observados quando o paciente olha para frente, fixando o olhar no dedo do examinador ou, preferencialmente, sem fixação ocular, podendo ser utilizados os óculos de Frenzel, que facilitam a observação da movimentação ocular. O nistagmo espontâneo está presente na crise aguda, acompanhado da tontura. Se houver nistagmo fora de uma crise, sem que haja sintoma de tontura, caracteriza-se como dissociação nistagmo-vertiginosa e o quadro é caracterizado como de causa central.
· Semiespontâneos - observados quando o paciente acompanha o dedo do examinador com os olhos para direita, esquerda, para cima e para baixo. Assim como no nistagmo espontâneo, os nistagmos de causa periférica - labirínticos - são normalmente horizontais ou horizonto-rotatórios e aumentam de intensidade quando os olhos se voltam para o lado da componente rápida do nistagmo, enquanto os nistagmos de causa central podem apresentar qualquer sentido, inclusive verticais.
· Evocados - quando não estão presentes espontaneamente os nistagmos podem ocorrer quando são realizadas manobras que estimulem seu aparecimento. Alguns exemplos são: a manobra de Dix-HallPike, manobra de posicionamento utilizada para diagnóstico de VPPB e a manobra de Head-shaking, que através da movimentação rápida da cabeça permite observar a presença de nistagmos latentes.
Alguns nistagmos são característicos de acometimento central, como os verticais (para cima ou para baixo), os pendulares e os multidirecionais.
3. Exames complementares
Gerais
A tontura é vista como um sintoma, não mais como uma doença. No sentido de investigar a causa deste sintoma - tontura - passam a fazer parte do diagnóstico uma série de exames (Quadro 1), que podem auxiliar na pesquisa de sistemas extravestibulares que estejam, por um "mau funcionamento", afetando de forma deletéria o labirinto.
Específicos
Alguns exames podem auxiliar na avaliação direta do labirinto.
O labirinto é formado de uma porção coclear e uma porção vestibular. A porção coclear, que é anterior, é mais voltada para a função auditiva e a porção vestibular para o equilíbrio.
a. Sistema auditivo
A audiometria e a imitanciometria seriam as primeiras opções para avaliação da audição. A audiometria é um exame subjetivo que avalia o tipo e o grau de perda auditiva. Os principais tipos são a audiometria tonal, cuja estimulação se faz com tons puros e a audiometria vocal, que testa a compreensão das palavras faladas pelo examinador.
A imitanciometria, também chamada de impedanciometria, divide-se em: timpanometria - que é a medida da complacência da orelha média - e a pesquisa do reflexo estapediano. A função do reflexo seria proteger a orelha interna de sons intensos através da contração do músculo estapediano.
b. Sistema vestibular
A eletronistagmografia (ENG) é o método utilizado para registrar os movimentos oculares durante provas oculomotoras e provas vestibulares. Popularmente chamado de "otoneurológico", o exame permite avaliar a função labiríntica de cada orelha separadamente.
Os testes oculomotores incluem pesquisa do nistagmo de posição, pesquisa do nistagmo espontâneo de olhos abertos e fechados, pesquisa do nistagmo semiespontâneo nas quatro direções, movimentos sacádicos, rastreio pendular e optocinético.
Os testes vestibulares incluem a prova rotatória pendular decrescente (PRPD) e a prova calórica com quatro estimulações (quentes e frias, à direita e à esquerda). O exame permite avaliar a função labiríntica de cada orelha separadamente.
Os métodos evoluíram em sua capacidade de captação do nistagmo. Assim, a vectoeletronistagmografia (VENG) utiliza três canais de registros, permitindo a observação de nistagmos verticais e oblíquos. A videonistagmografia (VNG) não utiliza eletrodos, capta os movimentos oculares por meio de sensores infravermelhos de óculos especiais.
4. Diagnóstico etiológico
O que diferencia a otoneurologia atual da exercida há algumas décadas é a busca pela causa da tontura. A investigação de uma etiologia que esteja levando à instabilidade do sistema vestibular norteia a conduta, que não é mais baseada exclusivamente no alívio do sintoma no momento da crise, mas no tratamento efetivo da doença labirintopatia de forma a erradicá-la.
O diagnóstico etiológico é amplo. O Quadro 2 tenta contemplar alguns possíveis diagnósticos diferenciais, tanto de topografias periféricas como centrais. Serão discutidos alguns tipos de labirintopatias mais prevalentes na população.
VPPB = vertigem posicional paroxística benigna; AVC = acidente vascular cerebral; VPBI = vertigem paroxística benigna da infância.
VPPB
A vertigem posicional paroxística benigna (VPPB) é a causa mais frequente de tontura. É caracterizada por episódios de tontura rotatória com duração de segundos, relacionada com a movimentação da cabeça. A doença pode ser autolimitada.
Os sintomas são causados pelo deslocamento de otocônias ou otólitos - que são fragmentos de carbonato de cálcio - do utrículo para a endolinfa dos canais semicirculares ou do utrículo para as cúpulas dos canais semicirculares, definindo uma canalitíase (ou ductolitíase) ou uma cupulolitíase, respectivamente.
O diagnóstico se faz através de manobras de posicionamento. Para o diagnóstico de VPPBs de canal anterior ou posterior são realizadas as manobras de Brandt-Daroff e Dix-Hallpike. Para as VPPBs de canal lateral existe uma manobra específica chamada, por alguns autores, de manobra de girar a cabeça ou Head Roll Test.
A realização da manobra leva ao deslocamento das partículas que estariam fora do utrículo, levando à estimulação labiríntica e a uma resposta de contração da musculatura ocular que é entendida como um movimento nistágmico.
De acordo com as características do nistagmo - principalmente direção e duração - é possível determinar o canal acometido, o local das otocônias (se na endolinfa ou na cúpula) e, consequentemente, o tratamento. A Tabela 1 resume os achados e o tratamento mais adequado.
O tratamento da VPPB é feito através de manobras terapêuticas. Estas têm o objetivo de liberar e reposicionar os otólitos. Conforme descrito na Tabela 1, para as VPPBs de canal vertical, as manobras são a de Epley e a de Semont, sendo que a de Semont é mais indicada para os casos de cupulolitíase. Para as VPPBs de canal lateral a manobra mais utilizada é a de Lempert ou manobra de Barbecue.
Doença de Ménière
Na doença de Ménière ocorre um quadro de hidropisia endolinfática. Esta hidropisia, que seria um aumento da pressão endolinfática intralabiríntica, pode ter diversas causas, sendo que os casos idiopáticos, ou seja, sem causa definida, recebem a denominação doença de Ménière.
CSPD = canal semicircular posterior direito; CSPE = canal semicircular posterior esquerdo; CSAD = canal semicircular anterior direito; CSAE = canal semicircular anterior esquerdo; CSL = canal semicircular lateral; VPPB = vertigem posicional paroxística benigna.
O quadro clínico característico se baseia em tontura rotatória intensa, com duração de mais de 20 minutos, acompanhada de zumbido, sensação de plenitude auricular e perda de audição ipsilateral.
Apesar da forte intensidade da crise, o paciente pode ficar totalmente assintomático entre as manifestações da doença. Podendo, inclusive, haver reversão completa da perda auditiva.
O diagnóstico da doença de Ménière é clínico, com critérios estipulados pelo Comitê de Audição e Equilíbrio da Academia Americana de Otorrinolaringologia e Cirurgia de Cabeça e Pescoço, mas alguns exames corroboram os achados. A audiometria tonal e vocal é essencial para a documentação da perda auditiva, que tem características de perda sensorial.
A eletrococleografia é um exame eletrofisiológico evocado que utiliza estímulos sonoros para captação de respostas elétricas cocleares e do nervo coclear, denominados potencial de somação e potencial de ação. A avaliação da relação destas respostas pode sugerir a presença de hidropisia endolinfática, auxiliando no diagnóstico de Ménière.
O tratamento da doença de Ménière é baseado na terapia combinada, que inclui tratamento medicamentoso, reabilitação vestibular e dieta. Como será tratado posteriormente, na parte de tratamento.
Migrânea vestibular
Na migrânea vestibular o sintoma acompanhante da tontura é a cefaleia.
A tontura tem características variáveis, podendo ser rotatória ou do tipo instabilidade, mas normalmente existe piora do sintoma com a movimentação da cabeça.
A cefaleia clássica é hemicraniana pulsátil, acompanhada de fono e fotofobia, náusea e possivelmente vômito.
Os sintomas auditivos podem estar presentes, como flutuação da audição, zumbido e plenitude.
Embora exista associação da tontura com o quadro enxaquecoso, não é mandatória uma relação temporal, ou seja, embora possa ocorrer momentos em que a tontura e a cefaleia ocorram juntas - normalmente uma precedendo a outra - este não é um critério para se diagnosticar a doença.
O tratamento da migrânea vestibular deve ser iniciado pela mudança de hábitos, incluindo alimentação e atividade física e excluindo os eventuais desencadeantes, assim como no tratamento da enxaqueca.
O tratamento medicamentoso se divide em medicação profilática e terapêutica. A profilaxia visa evitar tanto os quadros de tontura como os de cefaleia e as medicações terapêuticas são utilizadas no início da crise ou mesmo em um momento de aura, que anteceda a crise, de forma a abortá-la.
Labirintopatias metabólicas
O labirinto é um órgão extremamente sensível, sofrendo grande influência de alterações de seu aporte sanguíneo. Neste sentido, não apenas um baixo fluxo sanguíneo teria repercussão no funcionamento do órgão, mas a qualidade deste aporte também o teria.
Diversas alterações do metabolismo são citadas como possíveis causadoras de labirintopatias:
· Anemia;
· Hipercolesterolemia e/ou hipertrigliceridemia;
· Alterações glicêmicas;
· Disfunções tireoideanas;
· Disfunções de hormônios sexuais.
Dentre eles, o distúrbio do metabolismo do açúcar parece ser o principal responsável pela disfunção labiríntica.
O quadro clínico é variável, podendo estar relacionado ao grau de disfunção metabólica. Na maioria das vezes, a tontura tem característica não rotatória, tipo instabilidade, com piora em algum horário específico do dia.
A queixa de zumbido é bastante comum, normalmente em "apito", agudo e pode preceder o aparecimento dos quadros de tontura.
A perda de audição nem sempre está presente, mas sua característica peculiar é a perda em "U" invertido, ou seja, a presença de perda auditiva nas frequências graves e agudas, poupando as frequências médias.
O tratamento da labirintopatia metabólica pode incluir terapia medicamentosa que melhore a sintomatologia do paciente, mas deve ser baseada no tratamento da causa, de forma a erradicar a doença labiríntica.
Neurite vestibular
O quadro de neurite vestibular é caracterizado por uma tontura intensa, rotatória, que pode durar horas, acompanhada de náusea e vômito. Não há sintomas auditivos.
Como o próprio nome diz, acredita-se que haja um processo inflamatório do nervo vestibular. Sua etiologia é discutível, mas a mais aceita atualmente é que se trate de um quadro viral, podendo ser fruto de reativação de um vírus latente, provavelmente da família herpes.
O exame físico, na fase aguda, costuma ser bastante rico, demonstrando nistagmos espontâneo e semiespontâneo, provas vestibulares alteradas com queda.
A lesão labiríntica da neurite normalmente evolui para um quadro de hipofunção ou mesmo arreflexia do lado acometido.
O paciente deve ser medicado na crise com sintomáticos, como antieméticos e sedativos labirínticos. O uso de corticoide nesta fase ainda não é um consenso, mas parece antecipar a melhora clínica do paciente, embora não evite sequelas no sistema vestibular.
A reabilitação é muito importante na compensação do paciente, devendo ser iniciada tão logo o paciente tenha condições clínicas para realizá-la.
Síndrome multissensorial do idoso
Como já foi descrito, o equilíbrio está baseado em um tripé dos sistemas vestibular, visual e proprioceptivo.
O envelhecimento corporal leva também a um envelhecimento celular destes sistemas. No idoso existe uma perda visual normal, a presbiopia, também ocorre uma maior dificuldade na propriocepção, com perda óssea e muscular acompanhantes.
O sistema vestibular, por sua vez, também sofre envelhecimento, com perda e morte celular intralabiríntica. Este processo é mais facilmente observado na porção coclear do labirinto, pela perda auditiva progressiva, conhecida como presbiacusia.
A associação deste processo senil leva ao acometimento do equilíbrio como um todo, assim, os pacientes costumam apresentar queixas vagas de tontura, normalmente não rotatórias, acompanhadas de sintomas auditivos - perda auditiva e zumbido - de longa data e evolução lenta e progressiva.
Cumpre lembrar que no paciente idoso é muito importante a pesquisa de causas extra-vestibulares que também estejam influenciando na labirintopatia, como fatores cardiovasculares, metabólicos e neurológicos.
O tratamento medicamentoso da síndrome multissensorial do idoso é controversa, pois embora se acredite no benefício da medicação no que concerne a microcirculação labiríntica, por outro, não há sentido em utilizar sedativos labirínticos em labirintos sabidamente hipofuncionantes.
Neste sentido, a reabilitação vestibular parece ser a melhor opção terapêutica, baseando-se na compensação central, melhorando o equilíbrio e evitando quedas.
Labirintopatias na infância
Alguns tipos de labirintopatia ocorrem exclusivamente na infância. É o caso do torcicolo paroxístico da infância e da vertigem paroxística benigna da infância (VPBI).
O torcicolo paroxístico da infância (TPI) ocorre em crianças pequenas, de meses até aproximadamente cinco anos. Na crise, a criança apresenta choro, sintomas neurovegetativos, como palidez, sudorese, náusea e vômito e torção da cabeça. A doença costuma ser autolimitada e acredita-se que seja precursora da VPBI e da enxaqueca.
A VPBI acomete crianças maiores, de três a oito anos. A tontura costuma ser rotatória, com duração de minutos, podendo durar horas. Como no TPI, as crises são acompanhadas de náusea, vômito, palidez, sudorese e podem ter dor abdominal. A cefaleia pode ter as características de enxaqueca, já que se acredita que a VPBI é precursora da enxaqueca.
Quando se trata de labirintopatia na infância alguns pontos não devem ser esquecidos. O primeiro é excluir quadros epiléticos que mimetizem uma crise vestibular. O segundo é valorizar os abusos alimentares como estopins da crise e, da mesma forma, a mudança dos hábitos como a principal forma de tratamento.
Tratamento
O tratamento das labirintopatias deve inicialmente preocupar-se com a causa da doença. Medicações com ação específica no labirinto podem auxiliar neste tratamento e promover alívio da sintomatologia, mas nunca devem ser utilizadas sem que exista um acompanhamento e investigação do caso.
A terapia medicamentosa nem sempre é necessária, como é o caso da VPPB, na qual o tratamento é baseado nas manobras de reposicionamento.
Além das medicações, a reabilitação e as medidas dietéticas fazem parte do tratamento do paciente vertiginoso.
Medicamentoso
São diversas as drogas utilizadas no tratamento da vertigem. As mais utilizadas estão citadas na Tabela 2, juntamente com sua posologia.
A ação das diferentes drogas se baseia na melhora do aporte sanguíneo para o labirinto e no seu efeito inibidor, podendo-se escolher a melhor droga, de acordo com o tipo e a fase da doença.
Na crise aguda, a droga de primeira escolha é o dimenidrinato, que pode ser associado ao diazepam e, eventualmente, à ondancetrona.
Os corticosteroides não estão apresentados na tabela, mas são utilizados em casos de neurite vestibular - embora ainda não exista consenso na literatura - e em casos em que há associação da crise de tontura com perda auditiva súbita.
Reabilitação vestibular
A reabilitação vestibular (RV) tem como objetivo facilitar a compensação labiríntica. A técnica é fundamentada na estimulação de outros sistemas não labirínticos que também atuam no equilíbrio corporal - visão e propriocepção - e de vias do sistema nervoso central.
Existem vários protocolos de reabilitação, sendo os mais conhecidos: Cawthorne e Cooksey e o proposto por Herdman.
As manobras de reposicionamento, utilizadas para tratamento da VPPB, também são consideradas parte da RV. As manobras de Epley, Semont e Lempert, já citadas anteriormente no capítulo de VPPB, redirecionam as otocônias de volta para o utrículo.
Atualmente existem programas que utilizam a realidade virtual para RV. O aparelho, que inclui uma plataforma de força que mede o deslocamento corporal e óculos de realidade virtual, cria estímulos e situações estimulantes de forma a colaborar para a compensação labiríntica.
A RV deve ser iniciada o mais breve possível e tem resultados satisfatórios, tanto em acometimentos do sistema vestibular periférico como central.
VO = via oral; IM = intramuscular; EV = endovenoso; CI = contraindicação.
Orientações dietéticas
As cafeínas e o álcool têm efeito estimulante labiríntico, devendo ser evitados principalmente na fase aguda da doença.
Da mesma forma as dietas hiperglicemiantes e o jejum prolongado também podem ter influência no metabolismo normal do labirinto. Dessa forma se orienta uma dieta fracionada, sem abuso de açúcares e carboidratos.
As orientações dietéticas são importantes em todos os pacientes com labirintopatias, podendo, em alguns casos, promover melhora total do quadro sem a utilização de medicamentos.
High lights
1. Em 85% dos casos a tontura tem causa periférica, por acometimento da porção vestibular do labirinto. Causas centrais podem levar a perda da consciência e, inclusive, ser decorrentes de acidente vascular cerebral.
2. Tontura tipo vertigem, queda/desvio sempre para o mesmo lado em testes vestibulares e nistagmo unidirecional não vertical, são características de quadros periféricos.
3. A VPPB é a principal causa de tontura periférica e o tratamento é feito com manobras terapêuticas (Epley, Semont, Lempert), sem necessidade de uso de medicações na maioria dos casos.
4. Mais de 30 diagnósticos diferenciais de tontura são descritos, dentre eles: doença de Ménière, migrânea vestibular, síndrome multissensorial do idoso e labirintopatias metabólicas.
5. Na crise aguda a droga de escolha é o dimenidrinato. Outras medicações como anti-histamínicos, benzodiazepínicos, bloqueadores do canal de cálcio e antiagregantes plaquetários. A reabilitação vestibular e medidas dietéticas são parte do tratamento coadjuvante.
REABILITAÇÃO VESTIBULAR
É sabido que a atuação fonoaudiológica tem tido grande expansão social na área da reabilitação, abrangendo, também, a reabilitação vestibular. A reabilitação vestibular é um procedimento terapêutico fisiológico, realizado por fonoaudiólogos, que tem como objetivo melhorar e restaurar o distúrbio de equilíbrio corporal.
Quando o sistema auditivo e vestibular apresentam algum problema, individualmente
ou em conjunto, surgem como sintomas principais a tontura e/ou vertigem, com ou sem sintomas neuro-vegetativos. Esses distúrbios são conhecidos popularmente como “labirintite”, mas o nome correto que se dá a eles é “labirintopatias”, que significam doenças do labirinto.
Os problemas do labirinto podem ocorrer, porque a pessoa tem uma alteração
na região vestibular, e o cérebro acaba recebendo informações errôneas sobre sua posição num determinado lugar no espaço, e assim ter a sensação de mal estar, como se estivesse rodando, flutuando ou caindo, mas, na verdade, está parada.
Isto é resultado de um conflito entre as informações vindas da visão, do labirinto e do sistema proprioceptivo, que resulta na tontura, acompanhada dos outros sintomas.
Princípios – Quando o indivíduo sente vertigem ou tontura decorrentes do conflito sensorial, inicia-se o mecanismo de compensação central, que procura melhorar os sintomas ocasionados pela disfunção vestibular. O conjunto de todos os mecanismos que auxiliam os indivíduos a se orientarem e se equilibrarem no espaço, parados ou andando, é chamado de adaptação. A habituação é um desses mecanismos que irá, através de exercícios repetitivos prolongados, reduzir ou anular as respostas sensoriais.
O paciente que tem tontura evita o movimento, pois este desencadeia os sintomas; assim, ele se movimenta menos, o que acaba por gerar um retardo no sistema de compensação.
A reabilitação vestibular fornecerá ao paciente exercícios repetitivos adequados ao seu problema, que irão acelerar e estimular os mecanismos de adaptação, propiciando a volta do seu equilíbrio de forma mais rápida.
É importante ressaltar que a reabilitação vestibular é uma das diferentes opções de tratamento para o paciente com disfunção vestibular, podendo ser utilizada de maneira alternativa ou associada a outros tipos de tratamento.
Os Estudos – Segundo a fonoaudióloga Heloisa Helena Caovilla, professora Associada Livre-Docente da Disciplina de Otoneurologia da Universidade Federal de São Paulo – Escola Paulista de Medicina(UNIFESP-EPM), e uma das pioneiras nessa área, os estudos sobre o assunto surgiram em 1945, quando o médico Cawthorne submeteu soldados lesados pós 2ª Guerra Mundial, que apresentavam problemas de tonturas, causadas por traumatismos cranianos, a um procedimento de reabilitação vestibular que ele próprio elaborou .
Os fonoaudiólogos, por sua vez, atuam com reabilitação vestibular desde o final da década de 70.
“Quanto maior for a integração entre o fonoaudiólogo e médico, o tratamento
do paciente terá mais possibilidades de êxito”, esclarece.
Heloisa Caovilla explica que a reabilitação vestibular deve atender às necessidades individuais do paciente com problemas de equilíbrio e deve ser dirigida especificamente para as deficiências funcionais, identificadas em uma avaliação otoneurológica abrangente.
A UNIFESP-EPM foi a pioneira nesta área e há 15 anos criou o curso de especialização na área de Vestibulometria. O próprio Curso de Fonoaudiologia
já conta com a disciplina, e os estudantes de Fonoaudiologia do 2º e 3º anos
têm aulas teóricas e práticas.
A professora Heloisa alerta que, nas escolas, muitas crianças apresentam baixo rendimento por problemas de equilíbrio e, muitas vezes, são tratadas como crianças desconcentradas. “Seria muito importante que essas crianças passassem por uma avaliação otoneurológica e, se constatado o problema, deveriam ser encaminhadas para a reabilitação vestibular".
Bibliografia
Obs.: As referências bibliográficas deste artigo encontram-se com o autor, à disposição do leitor.
http://www.moreirajr.com.br/revistas.asp?fase=r003&id_materia=5961
http://www.moreirajr.com.br/revistas.asp?fase=r003&id_materia=5961
Fonte: http://www.moreirajr.com.br/revistas.asp?fase=r003&id_materia=5336
http://www.fonosp.org.br/revistas/edicao_40/40_ambito.html
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